27/12/2013

Trintanos

Inspirada pelo texto do Bia, resolvi escrever um também, em homenagem aos meus trinta anos.

Com cinco, lia turma da Mônica. Aprendi a ler.
Detestava ir pra escola, pra quê?

Com dez, lia Fernando Sabino que meu irmão me emprestou.
Já era tia, sabia trocar fralda e amava um serzinho de andar bêbado e cachinhos e bochechas gostosas.
Gostava de brincar de escolinha, passar dever no quadro, apagar.
Foi o presente que mais gostei na minha infância: um quadro-negro e uma caixinha com giz e apagador, dados sem motivo, num belo dia que minha mãe me buscou na escola e ele estava lá, no banco de trás do carro.

Com quinze já tinha minhas melhores amigas, são as mesmas até hoje, com umas 3 exceções.
Excessos e contos de mil e uma noites.
Ouvíamos muito rock e a internet surgia. Bom demais!
All Star e saia hippie, mil truques pro cabelo ficar bonito.

Com vinte já namorava, farreava ainda muito, experimentava a liberdade.
Morar sozinha, metrópole, praia, ônibus 24 horas, que maravilha!
Já podia viajar no ano novo, acampamentos, leituras de esquerda, engajamento.

Com vinte e cinco, envelheci.
Sofri por amor.
Descobri que o mundo é duro.
Diariamente sentia o cheiro do hospício, do presídio, da miséria.
Do esgoto da favela.
Da lindeza da loucura.
Trabalhar muito, dançar mais ainda.
Perdi um grande amigo.
Vi a praia mais linda do mundo.
A vida mudou.
Somos tão frágeis...diante do mar, diante da morte.

Com trinta rejuvenesci.
Quero viver muito, ver meu filho crescer.
Estar com ele nos marcos de cinco, dez, quinze, vinte, trinta anos, o quanto der.
Cuido do que como, do que bebo, do que falo.
Do que penso, ainda não consigo.
Procuro falar a metade, ouvir o dobro.
Involuntariamente, me preocupo o triplo.
Com a cidade, com o futuro, com o dinheiro, com a violência.
Com a assistência à saúde.
Com o que nos encarcera na ignorância de nosso corpo, de nossa potência.
Temo a morte dos que amo.
Valorizo e amo minha mãe a cada dia mais.
Me tornei mãe.
Realizo um sonho.
Amo.
Cada dia mais.

Vem 2014, sopro de vida para todos nós!

18/12/2013

A 10ª Semana ou As mudanças



As mudanças começaram!!! E de um dia para o outro, muito de repente.
Já vinha notando os seios um pouco inchadinhos, como na TPM. Mas de frente para o espelho, notei os mamilos bem mais escuros. Que legal!!! Até pensei que era coisa da minha cabeça, mas o marido confirmou (e minha mãe também na semana seguinte - grávida e exibida rs!). Percebi também que aquelas veias dos seios ficaram mais aparentes, percebo aqueles traços esverdeados bem fortes dos vasos. Muito interessante!
Essas mudanças corporais trouxeram uma reflexão bem forte...o corpo se prepara, todinho, para os processos fisiológicos. Essas mudanças nos seios favorecerão a amamentação. Pra quem nunca leu a respeito, o recém-nascido enxerga pouco, apenas vultos, e o mamilo mais escuro o orienta na hora de abocanhar o seio. Poxa, porque nos esforçamos tanto em negar o que nos é fisiológico? Porque se torna tão difícil amamentar? Vejo tantas inseguranças nas mães em relação ao peso do recém-nascido, curvas, padrões estatísticos que temos que seguir...Sei lá, fiquei pensando que nosso corpo vai fazendo tudo direitinho, a gente é que atrapalha ele!!! A falta de apoio familiar, o estímulo da indústria, o desespero, o cansaço, a sobrecarga da mulher. Não são poucos os entraves e os motivos para desistir da amamentação e longe de mim censurar quem não amamenta, até porque não sei como será comigo, apesar de desejar muito amamentar. Acho que, como em relação ao parto, temos que nos informar muito, conversar com os familiares, prepará-los e nos preparar também para dores e desconfortos, buscar profissionais que nos orientem bem e nos cercar de argumentos para os críticos de plantão, para que o aleitamento materno seja minimamente viável. Não adianta achar que é "natural" e pronto. Finalizo o assunto com a dica do excelente blog: Mamadeira Nunca Mais.
Voltando! No final desta semana, comemorei meu aniversário com a família. Não desejava fazer festa, estava introspectiva e, ao contrário de todos os anos, quis apenas almoçar com meus pais e irmãos. Foi uma delícia. Vi um dos meus irmãos que eu não via desde abril, foi bom demais. Ganhei lindos presentes das minhas irmãs, foi uma delícia, bem como eu queria. Pouca coisa, muito afeto.
Teve o encerramento de uma formação que faço para trabalhar com gestante, onde minha futura parteira é minha professora. Foi bem bonito este fechamento de ciclo também. Entrei no curso tateando o assunto, desejosa de engravidar no final do ano. Terminei já como doula, tendo acompanhado alguns partos na maternidade pública, com duas gestantes para acompanhar no início do ano que vem, e eu mesma uma gestante. Tudo tão diferente!
Fica a sensação de que cada semana é uma mudança, uma novidade...

16/12/2013

Planejado?

Pois é...comecei a falar no último texto sobre os palpiteiros de plantão.
Sinceramente, os palpites alheios não me incomodam.
Na família, entendo como demonstração de carinho e preocupação, mesmo que muitas vezes eu tenha que fazer aquela cara de paisagem básica (geralmente sobre parto, amamentação, etc.). Mas acho que uma gestação é algo que mexe com muitas lembranças e opiniões dos outros e é difícil a pessoa guardar certas coisas para si ao invés de despejar na primeira gestante que encontra. Quando concordo com o comentário, me manifesto. Quando discordo, costumo calar ou pontuar delicadamente algumas coisas...outras eu simplesmente ignoro.
Os estranhos que vem palpitar eu ignoro solenemente sem peso na consciência. Sabe aquele: "ãrram, tá"? Uso sempre, sem medo de ser feliz! Não estou nem aí, mesmo, silencio educadamente! Fila preferencial é o local privilegiado para isso...sempre que falamos: "sou gestante", pronto! Lá vem a enxurrada de palpites e perguntas!!!
Agora, duas coisas me surpreenderam desde que venho lentamente contando da gravidez. A primeira é que logo depois dos "parabéns", vem a pergunta: "já sabe se é menino ou menina?". Eu realmente não imaginei que seria tanta curiosidade assim sobre este assunto! Antes de engravidar, eu e meu marido havíamos combinado de não sabermos o sexo do bebê antes do nascimento. Mas foi só eu engravidar pra mudar de ideia!!! Marido ficou tristinho, mas eu realmente estou muito curiosa e querendo saber para poder organizar melhor as coisas...nome, roupas, etc. Não que eu vá fazer uma ultrassonografia por mês, de jeito algum. Mas quando der para ver, desejo saber. Mas a ansiedade alheia a este respeito me pegou realmente de surpresa! Não pensei que fosse tanta assim!
A segunda pergunta que mais tenho ouvido quando conto que estou grávida é: "foi planejado?". Sério, esta pergunta eu não consigo entender.
Para início de conversa, acho esta informação extremamente íntima para o casal. Se o casal está planejando, pode decidir comentar com alguns amigos mas pode também querer manter reservas sobre a questão. Já temos tantas ansiedades em relação a quanto tempo vai demorar para engravidar, se conseguiremos ou não, tantas cobranças internas, que o mais comum é o casal não comentar com ninguém - ao menos os casais que eu conheço. Sempre que alguém nos perguntava quando iríamos ter filhos, respondíamos: é um projeto para 2014. Não comentamos para quase ninguém que estávamos tentando.
Por outro lado, se o bebê não foi planejado, o que isso importa? Faz realmente alguma diferença para alguém, fora o casal? Alguns casais se desesperam logo que recebem a notícia, mas com o tempo se alegram com a ideia e quando chegam a contar para os familiares e amigos, é porque decidiram levar a gravidez adiante e querem dividir a novidade. Por que lembrá-los deste período que foi descobrir uma gestação não planejada? Vai acrescentar o quê na experiência do casal ou na vida de quem quer saber?
Outros casais não planejaram e recebem a notícia com imensa alegria. Tem também os "sem querer querendo", casais que não planejam ter filhos agora, mas também não estão lá evitando muito. Tem mulheres em idade fértil que tem uma vida sexual ativa e engravidam de algum homem. Tem homens em idade fértil que tem uma vida sexual ativa e engravidam alguma mulher. Há toda uma infinidade de matizes entre as respostas foi planejado ou não foi planejado...que diferença faz?
Os familiares e amigos íntimos certamente sabem se aquela gravidez foi ou não planejada. Os que não sabem, é porque não tem que saber!
O que mais me aborrece nessa pergunta é o machismo e moralismo implícitos. Quando alguma mulher admite: não planejamos a gravidez ou não planejei a gravidez, o mais comum é que ELA seja condenada por isso, nunca o homem. E lá vem mais uma enxurrada de perguntas: mas por que não tomou pílula? Por que não evitou? Engravidou por que quis, fala a verdade? Se o relacionamento não pressupõe que o casal more junto ou seja casado, lá vem mais julgamento ainda! Engravidou para prender o cara, para conseguir pensão, porque já está passando da idade e todos os mais variados julgamentos sexistas, machistas, moralistas e escrotos que existem.
Eu não fui uma filha planejada. Meu marido também não. Crescemos ouvindo todo o tipo de piadinhas, como "filhos da pílula" e por aí vai. Meus pais tinham quase 20 anos de casados e 5 filhos quando eu nasci. E minha mãe sempre ouviu todo o tipo de censura possível, pois teve 6 filhos. Minha sogra ouviu muitos julgamentos por ter tido 3 filhos em um espaço curto de tempo, enquanto estava ainda na faculdade. Tivemos problemas e felicidades como qualquer outra criança, fomos amados, educados, nossos pais erraram e acertaram como todos os outros, independente do planejamento familiar!
Talvez por essa razão eu abomine este tipo de comentário. Acho invasivo e preconceituoso. Me vem à cabeça mil respostinhas atrevidas e desagradáveis quando a ouço...como: "não foi planejado, não, inclusive doaremos para adoção assim que nascer"...e por aí vai.
Mas obviamente, sempre que vou responder, dou um sorrisinho amarelo e digo: "foi sim, estávamos tentando" e me solidarizo com todas as mulheres que não planejaram seus filhos, que não são casadas, que não são monogâmicas, que não são heterossexuais e que não tem uma resposta tão agradável aos ouvidos dos questionadores de plantão sobre sua vida sexual e reprodutiva.
Fico pasma de haver tanta modernidade e liberdade proclamada por aí e ainda se afirmarem tantas caretices, tantas patrulhas dos corpos e vidas alheias por aí!

12/12/2013

A 9ª semana ou A divulgação



A 9ª semana foi muito serena!
O fato de termos visto que está tudo bem com a pessoinha na ultra nos deixou muito tranquilos e radiantes.
Após muitos protestos dos nossos pais, deixamos que eles divulgassem a notícia para a família, pois vimos que seria impossível aguardar as 12 semanas.
A crença que está tudo bem, o otimismo e o desejo de não alimentar maiores temores contribuíram para liberarmos geral e contarmos para mais pessoas. Até então, só os íntimos que estavam sabendo!
Nossa família é imensa, temos dezenas de tios e centenas de primos e a notícia começou a correr!!!!
Contamos também em nossos trabalhos, recebemos tanto carinho que eu nem imaginei que seria tão legal! Muitas alegrias de todos os lados, foi realmente bem bom.
Comecei a sentir a barriga um pouquinho mais dura, algumas calças de cintura alta começaram a apertar.
Os enjoos diminuíram bastante e se reduziram somente à hora de acordar.
Alguns dias acordei com fome, outros um pouco enjoada, mas a sensação de bem-estar passou a ser mais presente do que o oposto.
Uma delícia!
Me percebi um pouquinho mais emotiva, como uma leve TPM, mas só em relação ao choro de emoção mesmo...vendo filmes, propagandas, lendo textos. Nada de irritabilidade como algumas mulheres comentam.
Entretanto, a notícia se espalhando e começam a chegar as histórias, os comentários, as opiniões e os palpites.
Soube que há um bottom inglês, distribuído pelo pessoal do Hypnobirthing, que diz: "Somente histórias de nascimentos felizes". Busquei na internet e ele realmente existe, é esse aqui ó:

Esse bottom é realmente bem útil!!!

10/12/2013

A 8a semana ou O Encontro



A semana do encontro! A semana tão esperada!
Voltei a trabalhar, bastante lenta de manhã e muito bem de tarde. Gosto do meu trabalho, me exige pouco, é flexível, com pessoas bacanas. Foi bom voltar!
A semana se arrastou, pois na 6a feira teria a primeira ultrassonografia.
Até que o dia chegou! Fomos eu e o marido, aquele nervosismo. Nunca havia feito ultra antes na minha vida, não sabia como era, toda nervosa.
A médica foi bem carinhosa, gentil. E quando introduziu a sonda, já apareceu na televisão (uma televisão enorme na parede), aquele formatinho, aquela cabecinha e o corpinho. Nem teve suspense, apareceu na hora.
Que alegria! Indescritível! Ficamos os dois boquiabertos, sem acreditar que era verdade mesmo, que o bebezinho estava ali.
A médica só elogiou, falou que estava super bem implantado, colocou o coraçãozinho para ouvirmos, mostrou ele pulsando. Muita emoção. Todos falam, mas só vivendo mesmo pra ter noção da beleza do momento.
Achei que eu ia chorar, já que me emociono à toa. Mas eu fiquei mais chocada mesmo, nem sei explicar. Achei tão grandioso, tão bonito! Como pode duas células, com metade de componente genético em cada uma, associadas ao amor, gerar isso? Não associadas somente ao amor romântico, mas ao amor que é desejo, que é vontade de estar junto, de compartilhar, que é disponibilidade, que é construção, admiração. Como pode produzir outra pessoinha assim?
Vi minha pessoinha. A pessoinha que fizemos. 2 centímetros. 176 batimentos cardíacos por minuto. De cabecinha pra baixo. Dentro de mim. Senti uma grandiosidade tão grande que não consegui chorar. Foi avassalador demais, não consegui nem falar nada.
Fomos almoçar e havia muitos adolescentes saindo da escola, indo para o mesmo restaurante que a gente. Barulhentos, aquela coisa chata de adolescente. Eu só olhava pra eles com uma ternura imensa...pensava: eles tiveram 2 cm um dia, são amados todo esse tanto que amo meu filhotinho agora. Sério, parecia que eu tinha usado alguma droga!!!!
Foi lindo demais! Gabriel filmou a parte final da ultra, depois que minimamente nos recuperamos do choque inicial e conseguimos clicar em botões do celular pra filmar - no início não conseguimos, os dois atrapalhados.
E sim, é um único feto, nada de gêmeos! E em dezembro teremos outro encontro. Decidimos, junto com a Enfermeira Obstetra, fazer a ultrassonografia de Translucência Nucal. Não é uma ultra super importante porque só traz estatísticas, não diz com certeza se tem ou não alguma síndrome. Mas achamos bom um novo encontro, para as opções de parto que fizemos, para irmos construindo a certeza de que está tudo bem.
Pra fechar a semana, tivemos um casamento e fiquei pasma de ver como meu corpo está em outro ritmo. Fiquei cansada de repente, precisava ir embora...muito diferente. Sinto que o corpo está sintonizado com a serenidade, com o silêncio, com o repouso, com a lentidão. Festa, barulho, música alta, não estava combinando, apesar da festa ter sido maravilhosa, com companhias incríveis, conversas animadas.
Em breve farei aniversário e está difícil conciliar esta sintonia com celebração de alguma espécie...

03/12/2013

Um relato de parto incrível - para espantar o medo (parte II)

Continuando!!!

O Parto
João nasceu dia 9 de março de 2013. Durante o último mês de gestação eu estava trabalhando no turno matutino, mas no dia seguinte (quinta-feira, 7 de março) ao encontro Ishtar sobre imprints pré-natais , estava marcado para eu ir à casa de terapias integrativas do Sofia Feldman, pela manhã. Eu frequentava a casa desde a trigésima quinta semana quando apareceu a insônia e, depois, um travamento na coluna.

Sentada no jardim com a enfermeira Lilia, eu relatava serenamente a recente associação que eu fazia do meu percurso materno com a relação com minha mãe e como sentia que o parto que se aproximava seria um momento importante nesse ciclo.

Cheguei àquele momento da espera que não tinha mais vontade de ler nada sobre o assunto ao mesmo tempo que nada mais me interessava. Não pretendia entrar de licença antes do parto, mas naquela tarde concluí que seria o melhor. Era hora de recolher-me. Ficaria no máximo uma semana a mais no trabalho.

Eu estava na trigésima oitava semana e pensava que João ainda demoraria um pouco para dar o ar da graça, pois não sentia nenhum sinal de que estava por vir e Beatriz, minha filha mais velha, tinha nascido perto das 41 semanas. Mas às 3 horas daquela madrugada (8 de março)senti a primeira contração. Levantei excitada. Perdi o sono. Fui à cozinha, comi algo mais um maracujá para tentar voltar a dormir, pensando ‘se for hoje, preciso poupar forças e descansar enquanto posso’. Consegui deitar e tirar cochilos. As contrações eram espaçadas (não as contei)e para acalmar-me balançava a pélvis, deitada. [A leitura do texto ‘Pariremos con placer’ de Casilda Rodrigañez, foi essencial, despertou-me para uma relação diferente com minha sexualidade e especificamente com meu útero, seu papel no equilíbrio psíquico e corporal e no alívio das tensões. Mais que recomendo a leitura.]

Às 6 da manhã da sexta-feira, 8 de março, meu marido, que dormia no quarto da minha filha com ela, levanta para ir à aula. Comento-lhe das contrações. Ele fica eufórico ao mesmo tempo que tenta se controlar e acreditar que talvez não seja o começo do trabalho de parto. A excitação dele me perturba. Sinto medo que sua adrenalina e ansiedade me atrapalhem (reminiscências da experiência anterior). Digo-lhe que pode ir à aula, pois as contrações ainda são leves e espaçadas e não sabemos se o trabalho de parto vai engrenar. Peço que infle a piscina antes de sair.

Diferente do trabalho de parto anterior em que as contrações se concentravam nas costas, dessa vez se concentram no pé da barriga. Bolsa térmica e a bola de pilates são suficientes para dar alívio. Sento na bola de frente para o computador e abro o Facebook. Não tenho vontade de conversar e graças à rede realmente nem preciso ligar para ninguém, pois estão conectados: Fred, meu colega de trabalho a quem aviso que não irei trabalhar, dizendo que o sulfato ferroso tinha me deixado indisposta e aproveitando para pedir um back up para lhe ajudar na oficina que daríamos na próxima segunda-feira; Polly, minha doula, que me sugeriu deixar a equipe de EOs de sobreaviso e se ofereceu para dar um pulinho aqui na hora do almoço; a EO Miriam que me aconselhou seguir ‘vida normal’ enquanto as contrações estivessem suportáveis; Eliana, amiga de barriga e de busca pelo VBAC a quem contei que estava com algumas contrações, ao que ela respondeu: ‘que emoção’. Eu não estava nem um pouco emocionada. Estava entrando naquele estado de indisposição corporal em que nada de fora importa. Para quem contei, contei, depois não falei com mais ninguém... Aliás, Kenia, amiga de trabalho com quem costumo almoçar, me ligou perto da hora do almoço para saber se eu ia ao trabalho. Atendi, disse que não, e quando ela me disse que tentaria ir ao chá de bênçãos no domingo, eu respondi que não sabia se até lá João já teria nascido.

Comecei, então, a organizar algumas coisinhas em casa, como fazer gelatina e suspender o cortinado da nossa cama. Estava sozinha com minha filha de 2 anos e meio. Durante as contrações, agachava para aliviar a dor. No meio da manhã, ela pediu para mamar novamente. Sentei-a no meu colo, mas durante as contrações queria agachar e quando pedia para ela descer do colo, ela começou a recusar e chorar. Então me dei conta de que não conseguiria tê-la por perto como tinha idealizado no plano de parto. Levei-a, em seguida, à casa da minha mãe, pedindo que ficasse com ela, pois estava com algumas contrações.

Deixei-a lá e voltei para a casa. Consegui tomar água de coco e deitar-me um pouco, usando a bolsa térmica. Voltei para a bola e minha mãe veio me ver. Vocalizava entre as contrações, gutural. E sentia que estava forçando a garganta.

Marcelo me ligou e eu disse que as contrações já estavam bem doloridas. Ele chegou na hora do almoço. Fez um ‘macarrão de doente’ (com um pouco de água, óleo e sal) que consegui comer um pouco. Nas próximas 12 horas só conseguiria comer minicolheradas de gelatina e tomar água.

A essa altura já estava doida que chegasse a Polly. Precisava de um olhar de fora. Cadê ela? Qual seu horário de almoço? Ela deve ter chegado umas 13h. Eu ainda conversava entre as contrações. Perguntei-lhe como deveria respirar, de que forma a vocalização podia ajudar mais. Antes que fosse embora, chamou a Inessa, que me doulou a tarde toda. Marcelo saiu para abastecer a dispensa que estava vazia e quando voltou ocupou-se da logística para encher e aquecer a piscina. Vez ou outra, ele se revezava com a Inessa. Eu me abstraí totalmente de toda a logística necessária para que eu vivesse aquilo ali.

Cada contração era um desafio. Era um caminho que, apesar de avançar, sentia que eu não ganhava know-how. Conto em menos de duas mãos as vezes que lidei de forma tranquila com as contrações, essas foram ou porque vieram suaves ou porque por acertar a soma da respiração, vocalização, posição tive alívio de forma a vivê-las com tranquilidade. Numa mesma contração, eu emitia sons diferentes (ahhhhhhh, uuuuuuu, humm) testando qual deles aliviava aquela contração em específico. Talvez aquela onda me pedia sons diferentes durante o seu movimento até chegar ao pico e começar a ceder. E assim, ela se ia, sem que eu tivesse conquistado a chave para decifrá-la. Se me esquecia de respirar, porém, parecia um cavalo indômito sem rumo. Por isso, me surpreendi muito quando escutei, mais tarde, a Miriam comentando com alguém que eu estava lidando muito bem com as contrações!

Até meados da tarde, tinha dúvidas se daria conta daquele trabalho de parto. Vinha-me o pensamento de entregar os pontos. Temia não dar conta. Putz, precisarei de outra cesárea.Nesse momento da tarde me dei conta de que daria conta de passar pelas contrações. O momento dessa mudança me faz compreender muito bem tantas mulheres que, estando nesse processo, desesperam. Passei, então, a exorcizar o medo, urrando durante as contrações. Estava na cama em quatro apoios, com o tronco sobre uma montanha de travesseiros. Lembro-me da Inessa comentar: ‘essa foi forte, né?’. Não pude responder, mas na verdade, sentia-a igual, eu é que sentia-me mais forte para enfrentá-la.

Enfrentá-la significava resignar-me àquele arrebatamento de dor. Ou talvez o contrário de ser arrebatada, ser chamada à terra. Aliás, durante todo o trabalho de parto sentia muita pressão no ânus e pensava que me faltava evacuar mais vezes, além da que tinha feito pela manhã. A EO Odete falava que podia ser a pressão do bebê. Se tive um fantasma persistente durante o trabalho de parto era esse cocô que eu achava que podia estar emperrando o processo!

Durante a tarde, mudei bastante de posição:
· Sentei na rede e entre as contrações, deitava para trás, apoiada num travesseiro. Era muito confortável e dava para descansar. Mas na hora da contração precisava puxar a rede para inclinar para frente, apertava a rede com as mãos (substituía as apertadas de mãos de outras posições), e precisava receber massagens (como em todas as posições que fiquei). O movimento de ter que levantar as costas me era incômodo porque estava com a pélvis extremamente dolorida (pelo mesmo motivo, não consegui ficar reclinada para trás na piscina, apenas sentada). Também sentia muita pressão embaixo. Sugeri abrir um buraco na rede, como fazem os Tapirapé, mas o rasgo foi aumentando e não me segurava mais (haha, os Tapirapé não cortam a rede, desfazem a trama sob onde se senta).

· Outra posição que gostei muito foi sentar na bola e me dependurar numa cangapresa à grade da janela. Sempre respirando e recebendo massagens na lombar, em todas as posições.

· Também usei bastante o chuveiro, sentada sobre a bola. A água aliviava bastante, mas a localização do ralo me impedia de ficar de costas para receber massagens, sem que eu inundasse o banheiro.

Sentada na rede, vi que a tarde se ia e lembrei que já estava no horário da reunião com a equipe de enfermeiras que atendem parto em casa. Mas elas não costumam ser muito pontuais. Inessa perguntou se queria que ligasse para Miriam. Eu disse que sim. Então, ela volta com a informação de que Miriam já estava no anel rodoviário, que já estava chegando, questão de 40 min. Quarenta minutos! Parecia-me uma eternidade!

Tinha vontade de entrar na piscina, mas tinha dúvida se era um bom momento. Eu achava que quando chegassem, as enfermeiras iam querer fazer uma avaliação do andamento do trabalho de parto, através de um toque. Eu não tinha ideia se meu trabalho de parto ia demorar ou não. Voltei para o chuveiro. Marcelo me disse que a piscina já estava morninha. Fui lá, pus um pé e aquilo era quase gelado para mim. Voltei para o chuveiro. Percebi que intensificavam as estratégias para conseguir aquecer a piscina.

Pelo prontuário, vi que a Miriam chegou às 19h30. Eu tinha acabado de entrar na piscina e não pretendia sair de lá tão cedo. Para meu alívio, ela disse que não fariam exame de toque, a não ser a meu pedido. Acenei com a cabeça, mostrando que tinha entendido.

Por dentro, fiquei pensando se faria ou não. Desde as últimas semanas da gestação, me vinha a curiosidade: será que já tenho alguma dilatação? Naquela altura do tp pensei o que já vinha pensando: se tiver no início da dilatação, vou desesperar; se tiver adiantada, vou achar que não vai demorar, mas tp não é algo linear. Resolvi que a informação mais atrapalharia que ajudaria.

Olhando para trás, aquela piscina era o ambiente que descrevi no prólogo do meu plano de parto (logo abaixo). Eu era aquele mosteiro, cercado de água. Dentro da piscina, fechava os olhos e me esquecia de tudo nos intervalos das contrações. Não me apetecia qualquer conversa trivial, ou mesmo a saudação de quem ia chegando, ao mesmo tempo, tudo era um ruído distante. A água me isolava de tudo, só chegava a ajuda... Quando a contração começava a chegar, reabria os olhos para ter certeza de que não me faltaria uma mão acolhedora para eu apertar e outra para fazer massagem na lombar.

No mundo distante de fora da piscina, Miriam fazia anotações, mexia no celular, colocou músicas do Kundalini Yoga, comentou algo sobre a música e eu assenti com a cabeça. Sua interlocução comigo era suave, com comentários despretensiosos. Durante as contrações soprava meu rosto e aquilo me trazia um alívio, como se me insuflasse o ar.

A essa altura as massagens (apertando as ancas), que no começo da tarde me traziam alívio, já não serviam mais, mas eu era incapaz de explicar isso. Então eu apenas selecionava quem fazia a massagem circular na lombar sem explicar o porquê (no caso Polly e Odete). Por esse motivo berrei, chamando a Odete, enquanto eu retirava bruscamente a mão de outra pessoa.

No final das contrações, tinha vontade de fazer força, como que empurrando para baixo. Mas sentia dor no local da cicatriz da cesárea. Relatei isso a Miriam que me disse com muita tranquilidade ser normal por ser o mesmo local da contração e porque a dor não permanecia aguda no intervalo das contrações. Ao escutar isso, desencanei. Só me acompanhou até o final o fantasma do cocô, haha, que saiu no expulsivo. Depois do parto, comentando com a Miriam de como estava cismada de que meu intestino devia estar emperrando o processo, ela disse: não tem cocô que segure quando o bebê vai nascer!

Continuava dentro da piscina. Miriam perguntou se eu queria fazer xixi e me disse que tem mulher que faz dentro da banheira mesmo. Eu tentei e não consegui. Então tomei coragem para ir ao banheiro (assim aproveitava para tentar evacuar e para esticar as pernas que estavam o tempo todo dobradas na piscina). Sentada no vaso, vejo Beatriz, minha filha, que me oferecia uma amêndoa. Bonitinha! E para agradá-la digo que sim. Então ela me explica que aquela era dela e que ia buscar outra para mim, rsrsrs. Quando ela voltou, eu já não conseguia dar-lhe atenção e nem aceitar a amêndoa para ser gentil.

Do vaso onde deixei só o xixi, entrei no chuveiro. Sentada na bola, durante as contrações, fazia força, pulava na bola, soltava gases e continuava achando que precisava fazer um bom cocô. No intervalo, dormia, deitada com a cabeça no colo da Polly que havia se acomodado dentro do box sob um banquinho. Fiquei aí um bom tempo. E avisei pro Marcelo pra manter a piscina aquecida.

Estava exausta e queria esticar as pernas. Saí do chuveiro e deitei na cama. Fiquei de quatro. Lembro-me da Beatriz ao meu lado. Tinha medo que ela demandasse algo a mim que não estava aguentando nem a mim mesma. Ela não pediu nada. E alguém zelava por ela.

Mesmo sendo desconfortável durante as contrações, deitei-me para descansar. Mais do que nunca precisava de apertar uma mão e de massagens nas costas. Só a Polly estava comigo e pedi que chamasse o Marcelo. Era para fazer massagem. Quando ela se levantou, desesperei. Tinha medo que não voltasse antes da próxima contração. Disse que o gritasse mas que não saísse dali.

Voltei à piscina. Beatriz ainda estava em casa. Isso deve ter feito eu achar que ainda não estava tarde. Pelo prontuário vi que voltei à piscina umas 23h. Em seguida, ela foi embora. Duas horas depois João estaria nascendo.

Marcelo entrou na piscina. Comentou ‘que calor’ e se mexia dentro d’água. Meu baixo ventre estava tão dolorido que aquela pequena vibração da água que batia contra minha barriga era o suficiente para me incomodar. Pedi para que saísse e segurasse minha mão do lado de fora. Realmente aquela piscina tinha se tornado meu espaço vital e sagrado. Sempre que via aquelas cenas de parto com marido segurando a parturiente por trás achava o máximo. Mas minha experiência de uma pessoa que tende tanto à simbiose precisava ser diferente, sentindo bem meus próprios contornos.

Como sentia muita pressão no ânus quando me agachava durante as contrações, sentei-me de lado na piscina e percebi que a pressão diminuía. As contrações mudaram de figura. Já não doíam, apesar de continuar sentindo todo o baixo ventre dolorido.

Comecei a fazer força. Na segunda, senti um ‘ploc’ que parecia a bolsa estourando. Odete perguntou se eu queria colocar o dedo no canal. Pus e senti algo! Fiquei entusiasmada. Pensei: já está baixo! E em seguida, pensei: calma, não quer dizer que está nascendo. Não sei por que, achava que ia demorar ainda. As doulas começaram a arrumar a câmera para filmar e eu que não falava nada soltei: ainda vai demorar, gente. Mas não me fizeram caso, haha. Odete foi chamar a Miriam.

Fazia força e e sentia ardência. Pensei: vai rasgar tudo. Lembrei-me então da enfermeira Jordana (pré-natal) que disse ter pensando o mesmo e não ter tido nenhuma laceração. Então tomei coragem e soltei a força que vinha de dentro. Odete falava ‘devagar’, mas a vontade de fazer força e de ver nascendo me faziam não medir o impulso. Marcelo, que me sustentava pela mão anunciou com entusiasmo, ‘a cabecinha!’.

Deliciosa sensação ‘tatear’ por dentro aquele corpinho passando por mim. Quando saiu o topo da cabeça, eu pensei que fosse a cabeça inteira; quando saiu o ombro, pensei que fosse o tronco, quando passou o tronco, pensei que já tinha saído todo. Quando bateu o pezinho por dentro, levei um susto com aquele peixinho e gritei. Nasceu às 0h54 do dia 9 de março de 2013.

Assim como no nascimento da Beatriz, escutei as lágrimas do Marcelo antes das minhas. Parecia inacreditável: João nasceu. Sentei-me, peguei-o no colo, entregue pela Odete. Tão fofo e tranquilo. Fiquei meio sem jeito para segurá-lo, querendo mantê-lo dentro d’água para aquecê-lo. Mamou. Miriam ajudou com a pega. Já havia esquecido que aquele rostinho pequeno precisava que afastasse um pouco a parte de cima do seio para não tapar-lhe o nariz.

Ao ver que o cordão já não pulsava, preparou-o para ser cortado pelo Marcelo que o fez todo todo, até posando para a foto.

E continuamos ali. Miriam me disse então que já se passara 1 hora. Uma hora! Juro que me pareceu ser 15 minutos. Sugeriu que eu saísse da piscina para o nascimento da placenta e para avaliar o João. Apesar de continuar sentindo cólicas que me faziam balançar as pernas, tinha me esquecido que a história continuava [O nascimento é o fim da história!] e que eu tinha que sair dali em algum momento. Dei um último cheirinho no João antes de entregá-lo a ela. Cheiro i-n-e-s-q-u-e-c-í-v-e-l.

Deitei-me na minha cama. Tive uma pequena laceração no períneo. Odete me avaliou antes da saída da placenta. Pareceu-lhe que não precisava suturar. Passou-se mais uma hora até o nascimento natural na placenta. Aliás, só nasceu depois que João voltou pro meu colinho e mamou novamente. Miriam veio me avaliar e recomendou sutura para uma cicatrização mais rápida, deixando a decisão a minha escolha.

Nesse momento, senti medo que o procedimento fosse dolorido, apesar da anestesia local. Por isso, pedi a minha mãe que segurasse o João e que Marcelo ficasse ao meu lado, segurando minha mão. A sutura, no entanto, foi um momento descontraído entre ‘comadres’. Enquanto a enfermeira costurava os dois pontinhos, conversávamos sobre o que acabara de acontecer, transformando em palavras a experiência daquele nascimento silencioso (tive a visita de dois reis magos que moram no prédio que chegaram lá guiados pela movimentação e urros do expulsivo, de madrugada. Foram recebidos pela janela por algum anjo que estava na sala, mas como João ainda não tinha nascido e esqueceram os presentes, o anjo avisou-lhes que estava tudo bem, mas que ainda não era Jesus, que eles tinham ainda 9 meses para enriquecerem-se com ouro e mirra).

Quando fui levantar para tomar banho, senti que estava fraca. Comi meio sanduíche e tomei água de coco. Polly me acompanhou num banho rápido. Lá comentei com ela: tiro o chapéu para quem vive isso no hospital. Ela me ajudou a vestir-me. Estava ofegante e um pouco tonta com perda de sangue.

Fomos deitar lá pras 6 horas, quando a equipe foi embora. Cochilei 1 hora. As 7h, Odete, que dormia lá em casa, levantou-se para ir para plantão. Eu estava muito eufórica. Fui dormir mesmo só depois do meio-dia.

Ainda falta debruçar-me sobre o que essa história trouxe para minha sexualidade e para a minha individualidade. Cenas dos próximos capítulos.

PLANO DE PARTO – ROBERTA - VBAC DOMOCILIAR
(Texto escrito no encontro 'Cura do não-parto'. O cenário que me veio à mente é do filme “Primavera, verão, outono, inverno e primavera”)
Água. 57% de água. O útero é um local escuro, um lar escuro, à revelia de todas luzes da ciência. Como aquele pequeno mosteiro no meio de um lago, protegido pela água e pela respiração.
Nada nem ninguém chegam a esse lugar protegido de forma invasiva. É preciso se fazer anunciar para ser buscado nas margens. O mistério é escuro e não deve nada a quem se sente ameaçado por ele. Respiração e água protegem e trazem para dentro do lar, lentamente, os convidados.
Os agressivos chegam à margem mas escutam "não" e aprendem a esperar o tempo da paz e a colaborar para que ela seja estabelecida.
Sou água e não há defeito algum na minha imprecisão. Apenas uma intradução. Trago para perto os que ajudam a me lembrar da água e da respiração. Os que ajudam a reencontrar a centralidade e a cuidar do lar e dos que me acompanham. Os que ajudam a me mostrar, a ser-me e a superar-me.
Com a força da terra,
com a leveza da água,
com a inteligência superior da respiração.



Coisa mais linda, né! Para finalizar, o que escrevi para a Roberta, ao ler o relato:
"Querida Roberta,
Seu relato de parto teve um efeito avassalador em mim.
Ainda é difícil colocar em palavras.
Acho que é o primeiro relato que me toca realmente, profundamente, agora que estou grávida.
Li tantos relatos, tantos, antes de engravidar, que agora todos que li já gestando são meio parecidos, me soam sem novidade (sem desmerecer a lindíssima experiência contida em todos eles, por favor!).
Mas o seu não. Te digo por que:
O fantasma da cesariana me assombra. Fantasma esse que nunca me assombrou antes. É minha 1a gestação, não tenho cesárea prévia.
Mas, como você relatou, ao gestarmos atualizamos todos os traumas e tragédias de nossa história. E há muitos anos nenhuma mulher tem seu filho de parto normal em minha família. Esse é o fantasma que se atualiza em mim, agora.
Já sonhei com meu parto, no meu quarto. E esse sonho sempre me tranquilizou, pois o interpreto como uma "visão" do futuro, então sempre soube em mim que, sim, eu vou conseguir parir.
Mas agora, que realmente tem um bebezinho em meu ventre e vou ter que pari-lo em breve, não me sinto tão confiante.
Por isso seu relato foi importantíssimo.
Não mais falarei ou pensarei na possibilidade de não conseguir. Reprogramação mental, já!
Vou trazer pra mim as energias da confiança e da serenidade, inspiradas em seu lindo relato.
Agradeço de coração!
A gente ao escrever não tem dimensão da potência de nossas palavras e nos efeitos que elas produzem no outro. Os efeitos de suas palavras foram extremamente benéficos aqui."

Então é isso, minha gente! Não mais esse papo de medo de cesariana. Eu vou conseguir. Meu bebê nascerá naturalmente, onde e quando decidir, terá uma recepção amorosa, respeitosa, da mesma forma que foi concebido e está sendo gestado. Tudo conspira para isso e nada de deixar o fantasma da desconfiança nos assombrar. Ele foi abolido, espantado pelos ghost busters (alguém aí é dos anos 80???).
Bola pra frente!

02/12/2013

Um relato de parto incrível - para espantar o medo (parte I)

E aí que não sei se alguém já ouviu falar, mas existe um grupo virtual de discussão, uma lista de emails incrível chamada PartoNosso. Ela existe há anos (mais de 10), tem centenas de pessoas inscritas. O tema é óbvio, né: é uma lista nacional de apoio ao parto.

As participantes oscilam: tem hora que está repleto de mulheres prestes a parir, rola aquela expectativa, depois os relatos de parto, ou o luto pela cesariana não desejada. Depois vem nova onda de positivos e assim os assuntos se renovam, algumas participantes são ativas há anos, outras dão uma sumida quando os bebês nascem, depois voltam grávidas de novo ou porque tiveram um tempinho e ficaram com saudades. Algumas ativistas, profissionais de saúde (inclusive alguns famosos do campo), mulheres que estão começando agora suas leituras sobre parto e chegam para começar do zero, mulheres que já pariram 2, 3, 4 vezes, tentantes... o público é muito variado, desde que haja o interesse pelo tema parto. Não é uma lista só de mulheres, mas o público mais ativo é quase esmagadoramente feminino.

Participo da lista há mais de 1 ano, eu nem estava tentando engravidar nem nada, apenas soube dela e, por me interessar pelo assunto, entrei. Desde então aprendi demais, acompanhei histórias lindas, reviravoltas incríveis de dar inveja às novelas da Globo! Mulher que abandona obstetra com 41 semanas, obstetra que tenta convencer o marido da gestante que quer VBAC dos riscos desta prática, partos pelo SUS, particulares, domiciliares, em todo o Brasil, em outros países, amamentação...gente, é um mundo de histórias e um aprendizado que não dá nem pra contar!

Nesta semana que eu estava tão mobilizada com meus medos da cesariana, muito reflexiva à respeito como falei no post anterior, chegou um relato de parto simplesmente incrível. Me fez pensar muito! Pedi autorização à Roberta e ela permitiu que eu o publicasse aqui.

Compartilho com vocês no intuito de dividir um lindo relato e, principalmente, uma reflexão importantíssima sobre confiança no próprio corpo, sobre a possibilidade de que o processo de gestar e parir seja curativo e também uma excelente oportunidade de elaborar nossa história e lidar com nossos traumas, superando-os, e, acima de tudo, transformando-nos.

Como o relato é bem grande e eu gostaria de compartilhar também algumas reflexões minhas após lê-lo, dividirei em duas partes: o início hoje e o resto amanhã. Voltem pra ler o resto, viu!!! Vale a pena!

Senta que é grande, mas é lindo: o Relato de Parto da Roberta, em Belo Horizonte-MG.

A decisão pelo PD
Parto domiciliar era algo fora de cogitação durante a gravidez da Beatriz que nasceu de uma cesárea indesejada.

Conheci a Ong Bem Nascer quando estava com 38 semanas da Beatriz. E voltei a participar do grupo de forma mais frequente cerca de um ano depois. O grupo me interessava muito, mas tinha algumas dificuldades, pois associava alguns posicionamentos a posturas com tons fundamentalistas que me evocavam lembranças de alguns embates que tive na minha vida missionária. Aproximei-me novamente por meio da Eliana que já havia voltado a participar há mais tempo, agora do Ishtar.

Depois de me informar um pouco por meio do grupo presencial e virtual, de leituras e de uma conversa com a EO Miriam, tendo o prontuário em mãos, comecei a entender que grande parte das cesáreas não é fruto de fatalidade, mas de uma cultura e crença tecnocrática da saúde, de uma misoginia da fisiologia feminina, da industrialização do parto, obrigando o peculiar a se enquadrar num partograma mediano.

Entendi que confiar incondicionalmente no profissional e eximir-me da responsabilidade era uma roleta russa e que a orientação de me internar com apenas 1 cm de dilatação foi o primeiro passo para não saber nunca mais o resto do que poderia ser aquela história. Optar por ter um filho em casa não era uma decisão louca ou radical e muito menos mais arriscada quando se considera a ambiência favorável ao desenrolar do trabalho de parto, sem obrigações de tempo. E isso sem falar nas evidências científicas.

A decisão crescia em mim. Mas não tinha a mesma estatura no meu marido que, no entanto, se abriu a ela logo após participar do encontro Ishtar em fevereiro de 2012. Só engravidaríamos em junho de 2012, numa noite de São João.

A essa altura, eu já não sabia mais responder à pergunta: por que PD? A não ser com a resposta: me dê motivos para sair de casa. Aliás, a possibilidade de ir para o hospital me angustiava. Foram as contingências da gravidez, juntamente com a visita e o pré-natal no Sofia Feldman, incluindo o ambiente gostoso das terapias integrativas, que trouxeram a serenidade para cogitar um plano B, caso fosse necessário.

A gravidez: exercício da espera, da confiança, da entrega...
Antes de saber que estava grávida, havia marcado novo GO para conhecê-lo e quem sabe fazer com ele o próximo pré-natal. Aconteceu, porém, que quando chegou a data da consulta eu já me sabia grávida de 5 semanas. Cheguei com o livro ‘Parto Ativo’ debaixo dos braços. O médico me sugeriu fazer acompanhamento paralelo com EO e ao final da consulta pediu que eu vestisse a camisola para examinar-me. Fez um toque, argumentando que precisava da informação para adiantar os pedidos de exame, já que eu não fizera o BetaHCG, apenas exame de farmácia.

Foi quando eu pensei: não tem jeito, mão de médico coça para fazer exames! Se fosse para uma primeira experiência, teria ficado com esse médico, pois era bem mais humanizado. Mas eu já estava calejada. E resolvi que queria ser acompanhada por EO, pensando numa formação menos intervencionista.

Por sorte minha, a enfermeira Raquel tinha me adicionado no Facebook, depois de termos nos conhecido num curso com a parteira Naoli Vinaver. E assim marquei com ela meu pré-natal na casa de parto do Sofia.

Antes da consulta, porém, tive sangramentos. Na primeira gravidez, o sangramento era aviso de que um aborto estava acontecendo. Na segunda, assim que começou um sangramento, a médica receitou progesterona para, caso o problema fosse com o corpo lúteo, segurar o feto. Nesta gravidez, optei em partir do pressuposto que meu corpo estava funcionando bem. [Para quem estava lá, foi na semana que aconteceu a audiência pública na ALMG sobre violência obstétrica.] Foi o primeiro exercício de confiança, não tão fácil para quem já passou por um aborto...

Combinei de trabalhar em casa, para evitar saculejos do transporte coletivo. [Aliás, comparar as estatísticas de acidentes em trânsito com as de ruptura uterina me ajudaram muito a perceber como os números são usados para nos amedrontar.] Após uma semana em casa, precisava de uma definição, se tiraria licença, se voltaria a ir ao trabalho. Foi quando decidi fazer um US que acusou placenta prévia. Era meu segundo (embutido no primeiro) exercício de confiança. Nesse momento, encarei o meu medo de não poder parir: faria o que estivesse ao meu alcance para ter o parto que desejava e entregaria ao acaso e à história o que não fosse possível.

Mas queria restringir a atuação do acaso. E por via das dúvidas, deixei meu ceticismo de lado e fiz um exercício de reprogramação mental: Pensei: tinha medo de não dilatar no parto da Beatriz e isso aconteceu. Tinha medo de placenta prévia e isso aconteceu. A partir de agora, reprogramo minha mente. E num dia, deitada na rede em casa, pensei: minha placenta subiu. E desencanei.

Só pude confirmar que a placenta estava em seu devido lugar no US morfológico, pois tinha decidido não fazer US a torto e a direito. Tudo perfeito no US. Placenta no lugar e nada mais com que me preocupar. Até que onze dias depois, estava eu no pré-natal e o coraçãozinho do filhote apresenta arritmia à ausculta. Com a idade gestacional que estava, nada a se fazer, nada com que se preocupar, mas tranquilize-se com uma informação dessa! Mais um mês exercitando a confiança e dando tempo para o coração amadurecer, antes de escarafunchar o mundo para saber o que deveria fazer caso a arritmia continuasse... A única pesquisa que fiz foi nos arquivos do grupo partonosso e vi uma resposta do Ric Jones à Jobis, dizendo que se ela já tivesse sido picada pela insegurança que fizesse o eletrocardiograma, algo assim. Parei de pesquisar. Por essa época, adicionei o Ric no facebook e comentei com ele sobre a arritimia ao que ele respondeu que provavelmente não era nada, uma imaturidade, talvez. E quando fiz referência à gravidez ser um exercício de confiança, ele respondeu: o parto acontece entre as orelhas.

Durante a gravidez, concentrei a psicoterapia que já fazia em trabalhar meus medos, feridas, cicatrizes, leituras e decisões relacionadas a gestação/parto. As aulas de kundalini yoga eram verdadeiros retiros que me ensinaram a respirar melhor e a meditar por meio da respiração. E por fim, os cuidados e ambiente da casa de terapias integrativas do Sofia que frequentei precocemente (a partir de 35 semanas devido a insônias que começaram às 32 semanas de gestação) foram essenciais na preparação para viver o parto.

Paralelamente marquei reunião com a equipe que atende em casa. Como o pré-requisito para ser atendida em casa é estar a termo e sem intercorrências, certezas que só temos ao final da gravidez, continuei o pré-natal no Sofia e ficamos de nos encontrar mais próximo da data provável.

Aborto, cesárea e parto: a vida não por acaso e o reatar com as origens
Para resumir essa seção, digo que os processos físicos da maternidade foram acompanhados (e algumas vezes guiados) por profundos processos emocionais, psicológicos, relacionais, sexuais, existenciais. Conto aqui um deles que foi fundamental: a experiência de crise e reconciliação com minha própria mãe e com minha própria concepção.

A quarta-feira que antecedeu ao parto teve encontro Ishtar. O tema foi imprints prenatais e foi abordado que, ao contrário do que se costuma valorizar (apenas a razão e a consciência e, em consequência, o indivíduo adulto), somos marcados por impressões desde as primeiras semanas de vida e quanto menor o organismo, maior o impacto que sofre. Essa reflexão me remeteu à minha história, à minha concepção. Nunca senti, conscientemente, qualquer rejeição por parte da minha mãe. Lembro-me de escutar, sem dar bola, ela dizer que tinha medo de eu ter sentido algo por ela não ter ficado feliz quando descobriu que estava grávida de mim, quando minha irmã ainda tinha meses de vida (mais outras 2 filhas, uma delas sua sobrinha de sangue, minha mãe é uma das filhas mais velhas de uma família que perdeu o chão depois que o pai sofreu acidente e ficou acamado). Eu não sentia nada disso. Ao contrário, cresci com a sensação de que meus pais se orgulhavam de mim, apesar de não ter sido planejada.

Quando completei 1 ano de casada, engravidei sem planejar. Vim de Ribeirão Preto, onde morávamos, a BH com poucas semanas de gestação realizar exames admissionais para o novo trabalho. Hospedei-me na casa da minha irmã, mas numa tarde fui tirar uma soneca na casa dos meus pais. Havia uma situação familiar delicada e por causa dela minha mãe pediu-me que eu não ficasse lá. Entendi seu pedido, dei-lhe um beijo de despedida, mas aquilo doeu e repercutiu em mim de forma desproporcional à situação. Senti-me órfã. Ecoou em mim a rejeição. Talvez aquela gravidez não planejada tenha me aproximado da minha própria concepção. Já havia me aproximado dessa experiência na vida religiosa: estudava filosofia e o Dasein, 'ser-aí', esse ser jogado no mundo, esse ser para a angustia e para a morte teorizado por Heidegger, encontrou em mim espaço para esse eco de ser fruto do acaso. Tendo esse horizonte, deparei-me num momento de meditação com a citação bíblica ‘com amor eterno te amei’ e desaguei num choro compulsivo sem conseguir alcançar porque tudo aquilo tocava tão fundo. Minha vida derivava do amor. E talvez acaso, deus e amor tivessem mais a ver do que eu imaginava até então.

Semanas depois eu descobria o aborto. A vida se ia. Depois disso decidi que não queria filhos tão cedo. Até que num quase acidente de estrada, a única coisa que pensei foi: não tive filhos. E resolvi que não queria adiar mais. A gravidez veio, então, de forma planejada e querida, mas insegura. Engravidei cerca de um ano depois da primeira vez. Quando me vi grávida, percebi que também precisava rever a relação com minha mãe que havia esfriado depois daquele episódio. Voltei para a terapia, impulsionada pela certeza de que as situações que não resolvemos, acabam retornando de alguma forma na configuração familiar, bem ao estilo da tragédia grega.

Meu desejo era afastar-me dela e assumir a orfandade, mas sabia que posteriormente me arrependeria disso. Então comecei a tratar uma ferida que me parecia impossível de curar. Era como iniciar um tratamento de saúde a um doente desenganado. O tratamento, no entanto, teve êxito e, mesmo sentindo a dor das feridas, voltei a sentir carinho por minha mãe.

Minha segunda gestação, a da Beatriz, corria bem. A única intercorrência, se assim se pode dizer, foi um sangramento no início da gestação. Mas essa foi a brecha para que o fantasma do aborto instalasse em mim uma insegurança que estaria na base do desfecho. Apesar de sentir muito apoio da GO que fez minha curetagem, ter feito o procedimento no mesmo dia que descobri o aborto me despertou a desconfiança. Juntava-se a isso o fato da minha irmã ter tido uma cesárea com ela. Com as informações que encontrei na internet, no site ‘Amigas do Parto’, tomei coragem de ter uma conversa com ela em que ela mesma disse que não acompanharia um parto naqueles moldes (parto verticalizado).

A fidelidade que lhe dediquei por ter me atendido com urgência quando me sentia desamparada, no dia que eu chegava de mudança em Belo Horizonte, foi difícil de ser superada. Demorei 2 meses para ter coragem de mudar de médico. Quando procurei o novo GO estava com sete meses de gravidez. Ele era atencioso e incrivelmente acessível. Senti muita confiança e relaxei. Era com ele que minha filha iria nascer.

A preocupação começou a ressurgir quando passei de 40 semanas e eu sabia que ele esperaria somente até 41 semanas. Para quem demorou 2 meses para mudar de médico, faltava tempo e coragem para uma nova mudança de última hora. Como se pode ler no curto relato do nascimento da Beatriz, ela nasceu de cesárea (intraparto?).

Era inacreditável que toda a minha busca pelo parto normal não tinha sido suficiente e cheguei a ficar tão desacreditada que lembro de pensar por um momento: não quero mais pensar nisso, o próximo será cesárea e pronto. Mas aos poucos fui revendo o caminho feito e percebendo as questões que me deixaram vulnerável à epidemia de cesárea: a insegurança na gravidez evidente pelo meu modo São Tomé de gestação, por exemplo, ver (US) para crer que estava tudo bem; a confiança exagerada no profissional (ao estilo: ele falou, eu obedeço) e a falta de empoderamento que se traduz em não assumir a responsabilidade no processo gestação/parto.

Entre as decisões para uma experiência diferente figurava uma opção simples: a de não avisar ninguém quando o trabalho de parto começasse e muito menos que planejávamos um parto domiciliar. O objetivo era evitar ansiedades e embates desnecessários. No entanto, numa das meditações na aula de kundalini yoga, vislumbrei a possibilidade de minha mãe estar presente. Durante o trabalho de parto da Beatriz, ela tinha vindo me ver antes que eu saísse para a maternidade, mas não estava conectada com o momento, por isso não gostei de sua presença e comentários. Ao mesmo tempo, já havia experimentado em outras situações difíceis como sua presença tinha sido consoladora. Comentando isso na terapia, foi-me sugerido conversar com ela, enfatizando a força que sua presença tinha. Resolvi, então, conversar com ela e envolvê-la na preparação para o parto do João. Falei de mim, dos meus sentimentos, da importância e força que ela tinha, dei textos para que lesse e levei-a em alguns encontros do Ishtar.

Continua amanhã!!!!

28/11/2013

A 7a semana ou A consulta



Percebi uma boa melhora em relação à semana anterior. O enjoo continuou, mas a indisposição melhorou e muito. O clima melhorou, o Sol saiu, ajudando a melhorar o humor. Tomei sorvete, tive vontade de comer mais coisas, me senti melhor. Ao acordar, o enjoo ainda vinha bem pesado, mas após o almoço eu me sentia muito bem. Mais feliz, mais bem disposta, mais animada.
Era uma semana de feriado nacional, decidimos ficar em casa mesmo, arrumar umas coisas do bebê que trouxemos da nossa viagem, outras muitas coisas que ganhamos do casal de amigos que tem um filhinho de 1 ano e tivemos a primeira consulta pré-natal.
A consulta foi ótima, descobri que emagreci 2 quilos desde que descobri a gravidez (me pesei no dia do resultado positivo). Conversamos muito, marido finalmente conheceu a Enfermeira Obstetra, tiramos dúvidas em relação a procedimentos pós-termo (após 41 semanas e 3 dias) - para quem se interessar: esperar nascer, com monitoramento mais frequente, chegando a acontecer a cada 2 dias após as 42 semanas - e conversamos sobre qual médica obstetra escolher, para fazer parceria com a Enfermeira Obstetra em nosso acompanhamento. Ela nos disse com quem sente mais confiança de trabalhar, gostamos da indicação, conversamos sobre valores das consultas e do parto, sobre como conversar com a família sobre nossas escolhas para o nascimento do bebê e chegamos ao assunto nevrálgico para mim: a cesariana.
Meu maior medo é precisar de uma cesariana. Detesto hospital, cirurgia, maca, soro na veia, médicos e enfermeiras que fazem coisas em você e não te explicam. Detesto não me sentir participando das decisões sobre meu corpo. Tenho verdadeiro pavor. Meu marido não fica atrás, detesta hospitais também.
Minha única experiência "cirúrgica" foi uma extração de siso e foi catastrófica. Fiquei tão nervosa que minha pressão subiu, piorando muito o sangramento e a dentista teve que interromper a cirurgia para conter um início de hemorragia, estabilizar minha pressão para depois continuar. Detalhe: eu não tinha nem 18 anos e minha pressão sempre foi baixa! A cada toque dela em mim eu pulava de susto, o que me fez levar muitas broncas. Ela e seu assistente conversando, com as mãos na minha boca e aquele cheiro de osso queimado, uma falta de ar...um filme de terror. Fiquei muito traumatizada!
Nunca fiquei internada e nunca passei por qualquer outra intervenção mais grave. Não tenho medo de tirar sangue em exames, já precisei tomar soro em 2 ocasiões na minha vida (mas em posto de saúde, com profissionais amigos que eu confiava totalmente), não é esse o problema. O problema é a vulnerabilidade. É me sentir um corpo sendo manipulado.
Mas sabemos que esta possibilidade existe. Segundo a OMS, cerca 15% de nascimentos por via cirúrgica é uma quantidade esperada, aceitável e previne mortes maternas e neonatais, logo não é uma percentagem tão baixa assim. Pode acontecer. Numa família de hipertensos e diabéticos (apesar de eu não ter nenhum problema de saúde até hoje), sei que algo pode acontecer e eu posso precisar de uma cesariana que, se bem indicada, irá salvar a minha vida e a do meu filho.
Mas eu tenho medo. Eu não quero. E eu preciso trabalhar isso em mim. A reflexão que a consulta me proporcionou foi bem profunda, eu não imaginava que tinha tanto bloqueio assim em precisar de uma cirurgia.
O que muitas mulheres já me relataram em relação ao parto, aquela ansiedade e medo de "o bebê está aqui dentro, como ele vai sair?", eu sinto em relação à cesárea. Espero que meu bebê possa sair pelo mesmo lugar que entrou, senão terei que me trabalhar muito para não ficar frustrada ou deprimida.
Agendada a cesárea não será, isto tenho certeza. Mas podem acontecer complicações que durante o trabalho de parto façam com que a cesariana seja bem indicada. Isso que me preocupa.
Mas temos um longo caminho pela frente para nos preparar. Para adquirir confiança e saber que vamos conseguir!

27/11/2013

A 6a semana ou A indisposição



Ainda bem que retornei de viagem! No dia que cheguei já começou o combo enjoo + mal estar + sensação de ter sido atropelada por um caminhão. Vontade de ficar só deitada o dia todo, no escuro. Fui abençoada com duas coisas que me ajudaram muito: estar de férias e uma frente fria que, em pleno novembro, fez o Rio de Janeiro parecer Londres. Chuva, frio, delícia para ficar na cama, como meu corpo pedia.
O único problema era a alimentação: não comer piora e muito os enjoos, mas eles não fazem com que se sinta vontade de comer nada. Logo fica uma luta: preciso comer, sei que é importante comer, mas não desce. A visão ou cheiro de qualquer comida faz o estômago revirar. Fui por tentativa e erro e descobri que água de côco e abacaxi bem geladinhos desciam. Que azeitona era ótimo para aliviar o enjoo. E umas torradinhas às vezes desciam também. Mas foi dureza.
O que achei mais difícil, confesso, foi a parte emocional. Eu fiquei muito triste de estar me sentindo assim. Queria estar feliz, radiante, realizada com a gravidez e lá estava eu de pijama, descabelada, mau-humorada e enjoada (literal e figuradamente).
Minha mãe ligava e eu tentava ser positiva, não comentar do mal estar, mas era bem difícil. Não queria ficar reclamona.
Como o planejamento era permanecer durante toda esta semana em outra cidade, a primeira consulta do pré-natal foi marcada para a semana seguinte. Mas eu tive curso com a Enfermeira Obstetra no final da semana e foi ótimo: ela me acolheu e falou palavras fundamentais.
Disse que este processo inicial de divisão celular exige muita energia, que não tem nada a ver com estar deprimida ou ser dramática, o corpo nos pede o que ele precisa. Meu corpo precisava repousar, calar, ficar paradinho para a divisão celular acontecer e era isso que eu estava fazendo. Com um sorriso no rosto e palavras carinhosas, ela mudou o meu astral e me senti muito bem. Não que os enjoos tivessem melhorado, mas meu emocional que melhorou. Como é bom estar bem acompanhada!
Para finalizar a semana, espinhas, muitas espinhas. Dezenas, nas laterais do rosto, na testa, nas costas. Doloridas, inchadas, vermelhas, inflamadas. Haja base e corretivo, pois nenhum creme para acne pode ser usado durante a gestação, logo a única coisa que se pode fazer é lavar bem o rosto várias vezes ao dia com sabonetes para acne e disfarçar com maquiagem.
Resumo da 6a semana: pijama, muitos seriados no computador, muitas sonecas ao longo do dia e pouquíssima comida.

26/11/2013

A 5a semana ou As cólicas



A 5ª semana começou estranha. Eu estava muito serena e tranquila, confiante, feliz. Mas tive muitas cólicas, cólicas leves, mas que duravam o dia todo, mas laterais da barriga, bem embaixo. Claro que fiquei preocupada.
Eu planejava iniciar o pré-natal só depois da primeira ultrassonografia, após ver a implantação do embrião e tal. Já tinha marcado a ultra pra 8ª semana, mas ainda estava longe e essas cólicas me incomodaram um pouco.
Resolvi ligar para a Enfermeira Obstetra/Parteira que me acompanhará. Já nos conhecemos, sou aluna dela num curso e ela comemorou muito a gravidez e me tranquilizou. Falou que as cólicas são normais e que é por causa da implantação do embrião no útero, que todo o tecido uterino fica diferente e em algumas pessoas fica bem dolorido. Ufa, que bom!
Eu tinha uma viagem marcada há meses: uma grande amiga ia ter seu bebê e eu marquei minha passagem para a DPP dela, mesmo sabendo da incerteza do nascimento. O bebê nasceu 1 dia antes da minha chegada, parto natural, lindo, ótima recuperação.
Os enjoos começaram, de leve. Se ficava de estômago vazio, não sentia fome, mas enjoo. Qualquer coisa doce me parecia intolerável, logo eu que sou viciada em doces e não fico 1 dia sem beliscar alguma coisinha.
Senti também um pouco mais de cansaço, de maneira geral. Uma necessidade de descansar, de diminuir o ritmo.
Foi muito interessante acompanhar uma recém-parida estando grávida. Uma sensação muito bonita de aprendizado. Já tinha acompanhado pós-parto das minhas 3 irmãs, mas todas tiveram seus filhos por cesariana. Fiquei encantada com o pós-parto de quem passou por um parto natural, sem intervenções, sem nem ter laceração.
Minha amiga estava bem, alegre, sem dores. Percebi nela uma grande vitalidade, muito diferente de uma recuperação cirúrgica, onde mal se consegue manter a postura ereta e levantar da cama é torturante. A barriga dela ficou muito pequena, achei impressionante! Quase normal, só um pouco molinha. Óbvio que ela estava cansada, o início da amamentação não é fácil, é dolorido, as noites são exaustivas, mas o semblante dela era outro. De prazer, de vivacidade. Mais um ponto a favor do parto natural!
O bebê era lindo e sereno e gordinho. Curti demais. Mas algo me chamava de volta pra casa. Uma saudade do ninho, do meu companheiro, da minha casa. Uma vontade de reclusão, de estar comigo mesma. Uma outra amiga fez um trocadilho perfeito: vontade de ficar chocando. E foi isso mesmo.
Gastei algumas muitas Dilmas e antecipei a passagem. Ao invés de ficar 1 semana fora, fiquei menos de 4 dias.
Foi a melhor decisão que tomei...porque a 6a semana não foi moleza, não!

22/11/2013

A 4a semana ou A desconfiança ou A alegria

E a 4a semana é a primeira, na verdade, de gestação, né! Porque uma gestação se conta a partir da data da última menstruação, mas sabemos que não engravidamos junto à menstruação. Logo tudo começa na 4a semana!
Aqui foi assim: a menstruação prevista para o dia 22/10, mas até então poderia atrasar uns dias sem significar nada.
Na madrugada do dia 22 para o dia 23 (quarta para quinta) teve uma grande ventania em alguns bairros do Rio, inclusive o que moro. Acordei de madrugada com portas batendo, os vidros da janela vibrando, o vento uivando. Levantei e fui tirar minhas plantinhas do parapeito, para evitar que caíssem com o vento, fechar as portas para não baterem.
Voltei pra cama no automático e deitei de bruços. Não aguentei! Uma sensibilidade imensa nos seios, doeu muito deitar de bruços. Uma coisa na barriga, uma sensibilidade diferente, parecia inchada...Sorri! Pensei, será? Não costumo sentir isso na TPM, coisa estranha...
Dia seguinte, tudo normal...mas a menstruação não veio. Tomei a decisão: se não vier até sexta-feira, farei o teste de xixi que eu tinha guardado.
Sexta-feira chegou e nada. Levantei antes do despertador e fiz o teste: uma linha muuuuuito fraquinha. Fiquei com medo de estar vendo coisas! Fui até o quarto acordar o marido e fazer a surpresa que planejei:

Dei esse body pro marido, assim que ele acordou. Ele achou o máximo, mas não entendeu que era o positivo! Quando eu falei, vibramos muito, mas ele ainda estava custando a acreditar.
Fiz o exame de sangue e estava lá, positivo. Saímos pra jantar pra comemorar e foi uma delícia, só alegria!!!
No final de semana contamos às famílias (pais e irmãos) e pedimos discrição até a primeira ultrassonografia. Recebemos muito carinho, foi uma delícia!
Resumo da 4a semana: só alegria!!!!

P.s.: O body é de uma loja virtual maravilhosa, a Marré deci. A dona é a Marina, um amor, sempre solícita nos emails e muito carinhosa. Uma mãe empreendedora que vale muito a pena apoiar. E para os nerds (como nós aqui de casa) é um prato cheio...muito Star Wars, Star Trek, rock e coisas bacaninhas.
Esta expressão, Bazinga, pra quem não sabe, é falada pelo Sheldon, do seriado The Big Bang Theory, quando consegue pegar alguém numa piada ou pegadinha!

21/11/2013

O Caminho até aqui - Parte II

Sendo assim, em Janeiro de 2013 parei de tomar anticoncepcional.
Como falei no texto Reflexões feministas - parte II, pela primeira vez me dei conta do mal que estava proporcionando ao meu corpo há tantos anos, sem qualquer reflexão, de forma automática, naturalizada e sem pensar nos efeitos. Eu e meu companheiro conversamos muito, ele também foi tocado com a oficina que participamos juntos em novembro passado e vinha notando as varizes em minhas pernas se reproduzindo ano após ano.
Decidimos que não era justo apenas um de nós sofrer todo o efeito deletério do medicamento, já que ambos não desejavam filhos naquele momento e, visando uma limpeza mesmo do organismo de tantas substâncias químicas, interrompi o uso e começamos a usar outros métodos para evitar a gravidez.
Passei a me observar: meu ciclo, meus hormônios, meu corpo, meu sangue. Tudo mudou. E para muito melhor. Para não dourar a pílula (com o perdão do trocadilho) a única coisa que piorou foi a acne. Tive acne na adolescência e após começar o uso do anticoncepcional ela reduziu para uma única espinha no período pré-menstrual. A bichinha voltou com tudo (pensava eu, logo vocês saberão mais sobre o assunto!). Mas comecei o tratamento dermatológico, com sabonetes e uma pomadinha, nada barra pesada para não voltar ao consumo frenético de medicamentos, o que controlou quase totalmente e fui sendo muito feliz fazendo as pazes com meus hormônios, me redescobrindo.
Fui a uma ginecologista obstetra conhecida por seus partos humanizados, fiz acompanhamento pré-concepcional. Tive grande melhora das terríveis enxaquecas que me acompanhavam por anos, fiz alguns exames de sangue, comecei a cuidar melhor da minha alimentação, comecei a fazer exercícios e o ano de 2013 foi passando com grande alegria e serenidade.
Em agosto, tiramos férias, visitamos amigos que não víamos há anos, vimos como é uma casa com um bebê, a importância da parceria do casal, porque a rotina é punk! Aprendemos um pouco sobre consumo (desenfreado e consciente), sobre o que é necessário ou não numa casa com um bebê, onde vale a pena economizar, onde não vale. Nos divertimos muito, nos curtimos, realizamos sonhos.
Na volta da viagem, a decisão: vamos começar a tentar! A princípio seria em outubro o início das tentativas, mas voltamos tão empolgados que resolvemos antecipar. Mas sem falar para ninguém, sem nos cobrar, sem neura de período fértil, sem medicalizar e medir, sem pressão. Vamos simplesmente parar de evitar e ver, quem sabe é rápido, quem sabe demora...o tempo dirá.
No primeiro mês de tentativas, setembro, claro que achei que tinha engravidado. Tanto tempo evitando paranoicamente que demora a virar a chave! Fiquei mal quando vi que não tinha rolado, confesso! Conversamos bastante e obviamente eu sabia que era uma tremenda de uma neura boba, me reposicionei e bola pra frente.
Em outubro, pensei muito pouco no assunto. Decidi fazer a seleção pro Doutorado, estudei muito, me cansei demais, horas a fio diariamente sentada escrevendo projeto, resumindo textos pra prova, estudando espanhol para a prova de línguas. Aniversário do marido, aniversário de casamento, tudo comemorado meio correndo, sem muito planejamento, pois a energia estava voltada pra seleção que eu tanto queria passar.
O resultado do doutorado sairia dia 25/10, mas antecipou e saiu dia 24: não passei. Fiquei bem triste, mais pelo esforço "perdido" (pois sei que nenhum esforço ou estudo nunca é realmente perdido) do que por não ter passado. A menstruação estava atrasada 2 dias, mas até então ela já tinha atrasado até 4 dias anteriormente, poderia não ser nada.
E foi dia 25/10 mesmo que saiu o resultado que eu tanto queria. A seleção tão importante, a da vida! Positivo! Foi muita felicidade!
Voltou com tudo a vontade de escrever, registrar, gritar por aí a alegria! E assim começamos nossa jornada...de passar a ser dois em um corpo só. De um casal passar a ser três. Quem quiser acompanhar...é bem-vindo!

20/11/2013

O caminho até aqui - parte I

O primeiro passo efetivo rumo à minha maternidade se deu em novembro do ano passado.
Então que, como disse no segundo post, mudei de tema no mestrado e estou nesta de escrever sobre parto, eu que já lia muito sobre o assunto, mais por curiosidade e desejo de me preparar para o que viria, num futuro até então incerto.
Com esta linda desculpa, me inscrevi no 21o. Encontro Nacional de Gestação e Parto Natural Conscientes, esse evento de nome pomposo que recebi a divulgação em meu email. Fui lá ver qual era, aprender, ouvir, conhecer pessoas.
O encontro era numa sexta, sábado e domingo aqui no Rio de Janeiro, num auditório simplesmente lindo, janelões abertos, luz natural entrando, um clima bem diferente dos novembros cariocas, onde os aparelhos de ar condicionados gelam todos os lugares possíveis.
Resumindo: o Encontro foi tão intenso sexta e sábado, que não tive corpo para voltar domingo. Cada palestrante demonstrava tamanho respeito pelo tema, uma aposta tão profunda e verdadeira, uma militância na vida, que nunca havia presenciado em nenhum evento do tipo. Doulas, pediatras, enfermeiras, parteiras, acadêmicos...independente da via de ligação com a temática, todos estavam de tal forma imbuídos na preocupação de divulgar, informar e reproduzir um pensamento de respeito ao nascimento, ao processo de gestar, parir e cuidar, que me tocou profundamente. Revi minha relação com meus pais, meu processo de ser gestada, nascida (de cesárea eletiva) e cuidada, aprendi e refleti muito.
O público era muito variado, desde doulas que viajaram centenas de quilômetros, até casais, mães e pais, profissionais, crianças. Isto favoreceu o tema das palestras, sem aquele ar professoral tão presente em eventos, mas uma calorosa conversa, onde todos estavam em sintonia.
A partir deste evento, me senti realmente no caminho para poder também gerar. Me senti extremamente privilegiada por poder aprender tudo isso antes de estar grávida ou ser mãe, por ter tempo para processar essas informações e sentimentos sem estar atravessada pelo turbilhão de hormônios e medos que vêm junto com o filho.
Uma semana depois deste encontro, uma das palestrantes, inglesa, a Julie Garland, fez um workshop voltado para casais que pretendem ter filhos, baseado num programa que ela oferece na Inglaterra para este público. Basicamente ela fala sobre preparação física, emocional e até espiritual para o processo de gestar. Muitíssimo interessante. Fomos eu e meu companheiro, um pouco desconfiado, mas topando experimentar. Foram quase 10 horas de grupo de conversas, experiências e aprendizados e, para falar o mínimo, foi transformador. Fundamental!
Assim, em novembro de 2012, essa revolução teve início.
Do particular, privado, para o coletivo. O que esse aprendizado teve de importância para meu próprio crescimento pessoal, acabou se tornando tão grande que não coube e transbordou, teve que sair, pra atingir também outras pessoas.
Mudei de tema, conheci pessoas, me inscrevi em dois cursos de formação de doulas (com abordagens diferentes e igualmente maravilhosas).
Participei de um parto como doula voluntária numa maternidade pública aqui no Rio. Vi muita violência obstétrica, tanta que me impediu de voltar.
Agora acompanho 3 gestantes e seus bebês, ansiando apoiá-las num parto respeitoso.
Mas o principal foi a urgência em dar continuidade na preparação física e mental para gestar, mesmo sabendo que provavelmente ainda demoraria um ano inteiro para isso...

19/11/2013

O caminho até aqui - Introdução

Fato que é que sou mãe!
Ainda é estranho falar em voz alta, mas é verdade.
Após 2 meses de tentativas, o exame positivo. Que alegria!
São muitos blogs de maternidade, mas resolvi escrever aqui semanalmente como andam as coisas. Pouquíssimas pessoas sabem, logo, se você é um dos meus 3 leitores e me tem no facebook, peço que não comente nada por lá por enquanto.
São muitas estatísticas negativas..de 10 a 20% de todas as gestações são inviáveis e resultam em aborto espontâneo até a 12ª semana.
Claro que, otimista de carteirinha, tenho a certeza de que em julho haverá mais um flamenguista nesse Rio de Janeiro, mais uma pessoinha morena e muito amada, mas ao menos até dia 22 de novembro quando faremos o primeiro ultrassom e veremos o coraçãozinho pulsar, quero manter a discrição.
Sendo assim, gostaria de registrar todo o caminho até aqui.
São muitas lembranças, composições, construções para a minha maternidade, como escrevi no último texto.
Algumas, especialmente, acho importante ficarem registradas.
Hoje começo com uma lembrança de Julho de 1997, ano da minha primeira menstruação.
Neste julho, viajei para Cabo Frio com meus pais e ia muito à praia sozinha, para ler, pensar, coisas que sempre amei fazer. Numa dessas idas ao mar, barriga bem inchada e sensível indicando que a menstruação viria, alisei a barriga e pensei: que barato que deve ser estar grávida! Esta é uma das minhas primeiras lembranças de que eu realmente queria ser mãe, queria gestar um dia, num futuro. Eu tinha 13, quase 14 anos.
Lembro também de uma preocupação quando muitas amigas do colégio já tinham menstruado pela primeira vez e eu não. Eu sabia que para engravidar um dia era necessário menstruar e tinha medo de não menstruar nunca. Sempre me senti atrasada, que coisa doida!
Hoje percebo que não tinha nada demais, menstruei pela primeira vez com 13 anos e alguns meses! É que havia as meninas já com corpo de mulher, seios fartos, quadris largos já nessa idade e eu era tão magrinha, tão menininha, que temia nunca me sentir uma mulher.
Bom, neuras a parte, nada disso aconteceu! Menstruei sim e sempre regularmente, evitei durante anos uma gravidez indesejada, me preparei demais para gestar e cá estou, a cada dia com mais certeza de que quase nada prepara para essa deliciosa experiência.
Me pego quase sempre emocionada, geralmente lerda e burra, às vezes temerosa e preocupada...será? Será que irá tudo bem? O bebê crescerá bem e saudável? Será que é um só? Será que terei meu tão desejado parto? Será que seremos bons pais? Será que o dinheiro vai dar?
São perguntas que vem e vão, sem muitas neuras, mas que compõem esse novo estado em que me encontro. Amanhã continuo...

29/05/2013

A minha maternidade

Muitos assuntos que gostaria de escrever, mas sem muita iniciativa...até que um cartão da Lu, dizendo que gostava do blog, me animou.
A partir de uma conversa ao telefone ontem, pra variar reflexões sobre a maternidade, comecei a pensar em como está se constituindo a minha maternidade. Sim, é uma experiência única, singular, mas não individual, já que construída por minha relação com tantas mães ao meu redor.
Ainda não sou mãe, digo ainda pois pretendo ser em breve. Mas percebo que minha maternidade começou com minhas primeiras lembranças, que eram de um corredor escuro, quando eu acordava no meio da noite, saía do quarto que dividia com minhas 3 irmãs e ia me deitar com minha mãe, na cama dos meus pais. Essa experiência, de ter sido sempre acolhida no meio da noite, esse aconchegar na cama quentinha, agarradinha com ela, sem nunca ter sido mandada de volta para minha cama, constitui a minha maternidade.
Com 8 anos fui tia, minha irmã teve um bebê e durante um tempo moramos todos juntos. Minha mãe ajudava a cuidar do bebê enquanto minha irmã trabalhava, sem usar mamadeira para não comprometer a amamentação. A inesquecível cena da minha sobrinha, ansiosa, apressada, abrindo os botões da blusa da minha irmã para mamar, seja com 6, 10, 15 ou 20 meses, e mamar ao seio esticando a mãozinha para ser beijada, constitui a minha maternidade.
Em uma festinha de aniversário de um ano da filhinha de uma amiga, conversamos sobre cansaço e a conciliação da vida profissional e a maternidade. Minha amiga comenta que a filha acorda cerca de 3 vezes por noite e ela entende que isso é para estar junto com ela, já que passam todos os dias, de segunda a sábado, separadas enquanto trabalha. Eu insinuo que isso deve ser bem difícil e cansativo, ao que ela, com um imenso sorriso, me diz que adora, pois ela também sente muita falta da filha e se o encontro delas por enquanto é noturno, durante a amamentação, foi o possível e ela aceita. Este sorriso constitui a minha maternidade.
Não são cenas idealizadas, longe de associar maternidade a sacrifício, mas refletem escolhas de determinadas maneiras de se relacionar com o filho, seja bebê ou criança, jeitos de maternar que me são inesquecíveis, e que pretendo seguir.
Acolhimento, afeto, amamentação, encontro, carinho, saudade...palavras que creio serem bem importantes nesta relação mãe-filho, que já experimento como filha e imagino como será do outro lado.
A correria deste moderno jeito de viver coloca estes conceitos à prova o tempo todo, com Super Babás e Desencantadoras de Bebês que pregam a manipulação de seus pais pelos filhos, estimulam o "deixar chorar", o leite artificial, a aparente felicidade da mãe em primeiro lugar. Digo aparente pois não creio que uma mulher ficará feliz ao fechar a porta e deixar seu filho chorando.
Acredito em relações, equilibradas, sinceras e sólidas, encontros bons, que trazem alegria e segurança. Sou contra mentiras, manipulações e adestramentos, em quaisquer relações, principalmente onde um é superior em idade, altura e experiência, como no caso da maternidade.
Longe de ideais cosméticos, com altas doses de realidade e amor, assim venho construindo minha maternidade.

01/02/2013

Reflexões feministas - Parte II: Saúde Reprodutiva

Não tenho a intenção de abordar neste texto toda a complexidade das muitas questões que envolvem a saúde reprodutiva, mas começo dizendo que pessoalmente acredito que essas divisões são meramente teóricas e tem o objetivo apenas de organizar o imenso campo de estudo que é a saúde humana. Já trabalhei na área da Saúde Mental, Saúde Pública, estudo Saúde Coletiva (qualquer dia podemos falar sobre a leve diferença conceitual entre as duas últimas) e me aventuro a escrever uma dissertação sobre Saúde Reprodutiva.
Muito se falou sobre o assunto das pílulas anticoncepcionais ontem e hoje, por conta da proibição da comercialização de um determinado anticoncepcional de um gigante laboratório, ocorrida na França. Para quem não acompanhou, a proibição ocorreu devido à associação de 4 mortes de mulheres por problemas vasculares ao uso do contraceptivo.
Obviamente quaisquer medicamentos tem seus efeitos colaterais e cabe ao médico, ao prescrevê-los, primeiramente pesar se os benefícios de tal prescrição supera os riscos e, após prescrever, orientar e alertar seu paciente sobre tais riscos, para que este possa decidir se irá ingerir ou não o remédio.
Uma outra questão é o que o surgimento dos contraceptivos significou na vida das mulheres, um grande avanço na direção da liberdade sexual e reprodutiva, creio não precisar me alongar muito nisso.
Entretanto, vejo adolescentes cada vez mais jovens iniciando o uso contínuo da pílula anticoncepcional, como eu mesma, que tomei nos últimos 11 anos ininterruptamente.
Os benefícios são muitos, além de evitar a gravidez, diminui a oleosidade da pele, os desconfortos pré-menstruais, a possibilidade de micro-cistos nos ovários. Mas tem o risco de prejuízo da função hepática e, mais frequentemente, os problemas vasculares. Esse infográfico foi publicado pela Folha de São Paulo e explica bem, fora isso todo mundo que toma anticoncepcional ou conhece alguém que toma vê aquelas micro-varizes, linhas finas roxinhas que se proliferam ano após ano nas pernas (e mesmo em outra partes do corpo). Quem fuma, aumenta muitíssimo o risco de doenças vasculares. Ok, tudo isso está na bula, mas será que estamos realmente assumindo esses riscos a partir de uma reflexão, ou estamos tomando pílula já que todo mundo toma e não precisaremos daquela conversa chata sobre o uso da camisinha feminina ou masculina com nossos parceiros?

Temos que realmente pensar como um efeito contraceptivo que é interessante ao casal prejudica a saúde apenas da mulher. O fato de não querer engravidar se torna muito mais importante do que cuidar da saúde de um integrante da relação. Acho que isso dá o que pensar, como em nossas mínimas práticas a saúde do homem vem sim primeiro do que a saúde da mulher. Além disso, é muito lugar comum culpar a mulher quando a gravidez indesejada acontece "ué, porque não tomava pílula?" ou "foi ela quem esqueceu de tomar a pílula", chegando ao cúmulo de já ter presenciado uma nova regência verbal "ela engravidou-se", como se o ato de engravidar ou de evitar a gravidez fosse responsabilidade apenas da mulher.
Enfim, não tenho a pretensão de esgotar o assunto e sim de provocar a reflexão, muito menos pretendo demonizar o uso dos anticoncepcionais. Mas aposto nas escolhas informadas, pensadas e questionadas e creio que não é isso que vem acontecendo quando logo no início de uma relação uma jovem de 17 anos vai até a farmácia comprar a primeira cartela de anticoncepcional. Em tempo, após quase 12 anos, eu não tomo mais pílula e tal decisão foi fruto de muita reflexão e conversas com meu companheiro, que concordou totalmente e agora participa ele também do ato de evitar filhos.
Pra finalizar, o que todo mundo já devia fazer, tomando ou não a pílula: USEM CAMISINHA!

28/01/2013

Reflexões feministas - Parte I: Dicotomias

É muito difícil pensar além das dicotomias, principalmente por sermos educados a separar tudo em dois opostos. Taí a razão de eu ter demorado tanto tempo para perceber e me auto-denominar feminista, mesmo tendo me sentido uma a vida inteira.
Me explico: por desde sempre ter tido a vontade de ser mãe, de viver com um companheiro, monogamicamente, reproduzindo até um certo ponto a dinâmica familiar de meus pais e tios, sempre me considerei "careta". Feminista não combinava com esses desejos, pensava eu, por isso nunca falei nada a respeito, mas pensava e muito.
Na faculdade de psicologia, estudei teorias e autores que desconstruíram o pouco que restava de meus preconceitos, conheci pessoas diferentes, formas diferentes de viver, de ser família, de se divertir. Continuei com meus desejos, mas compreendi a beleza de se desejar outras formas de viver a vida, aprendi o que são direitos humanos, liberdades individuais, coletivo, sociedade. Me indignei profundamente, criei brigas homéricas em almoços e jantares de família ao ouvir comentários tão reacionários e violentos saindo de bocas tão cultas.
E meus próprios desejos começaram a me incomodar. Pensava que, para ser coerente com minhas idéias libertárias, teria que viver uma relação conjugal libertária, que desejar a monogamia era uma caretice. Me desrespeitei, me violentei, experimentei e sofri muito. Fiz análise, um investimento maravilhoso em mim mesma, e a partir daí consegui admitir que desejava sim, essa vidinha pacata, marido, filhos e casa própria, e descobri na militância na área da saúde mental uma forma de canalizar e minimamente divulgar tudo aquilo que aprendi e discuti na faculdade.
Agora, no mestrado em saúde coletiva, com um discreto amadurecimento teórico e na vida, com o apoio de uma amiga e muitas desconhecidas que colocam na internet suas reflexões e militâncias (veja ao lado -> ) a ficha caiu. Que preconceito bobo é esse, ao não me dizer feminista, pensei? Por que militar por uma causa é fazer pensar, é divulgar, é produzir a reflexão. Lutar por um direito é assegurar que quem desejar ou precisar exercê-lo possa não ser perseguido por uma comunidade ou pelo próprio Estado, mesmo que você nunca tenha que passar por isso. É ser a favor do aborto para além da própria religião, dos direitos sexuais mesmo que sua orientação seja a dominante. É ser a favor de cotas tendo entrado na universidade pública sem elas. Ser a favor do SUS tendo plano de saúde. É medir as próprias palavras porque as palavras criam o mundo e o mundo já está preconceituoso pra caramba.
Aí percebi que venho exercendo uma postura feminista, lutando contra o conservadorismo e o masculinismo em minhas práticas mais simples, mais bobas. Sendo chata e cuidadosa em minhas opiniões e ações. Em minha vida monogâmica, classe média, caixa econômica federal (como jocosamente intitulo meu modo de vida), não acho que meu companheiro "me ajude" com a casa, pois ele limpa a casa que é também dele, como eu limpo a que é minha também e cada um faz como pode para que o lugar que moramos juntos esteja do jeito que gostamos. Por que ele passa as roupas dele e eu uso as minhas sem passar. Por que dividimos as contas conforme nossos salários, já tendo eu pagado tudo em alguns meses e ele em outros, por que ninguém tem a pretensão de mandar ou influenciar o outro, por que discutimos todas as decisões, até ambos ficarem bem com elas. Cito exemplos bem bobos, mas que em conversas com muitas mulheres vejo que são questões nevrálgicas nos relacionamentos, onde aparecem a dominação e a submissão sem que ninguém pense nisso.
Mas restava um último viés da questão, que há 1 ano passou a me incomodar de leve, me fez refletir bastante e consegui neste mês trabalhá-lo e resolvê-lo. Fica pra um próximo texto: a questão do anticoncepcional.