28/01/2013

Reflexões feministas - Parte I: Dicotomias

É muito difícil pensar além das dicotomias, principalmente por sermos educados a separar tudo em dois opostos. Taí a razão de eu ter demorado tanto tempo para perceber e me auto-denominar feminista, mesmo tendo me sentido uma a vida inteira.
Me explico: por desde sempre ter tido a vontade de ser mãe, de viver com um companheiro, monogamicamente, reproduzindo até um certo ponto a dinâmica familiar de meus pais e tios, sempre me considerei "careta". Feminista não combinava com esses desejos, pensava eu, por isso nunca falei nada a respeito, mas pensava e muito.
Na faculdade de psicologia, estudei teorias e autores que desconstruíram o pouco que restava de meus preconceitos, conheci pessoas diferentes, formas diferentes de viver, de ser família, de se divertir. Continuei com meus desejos, mas compreendi a beleza de se desejar outras formas de viver a vida, aprendi o que são direitos humanos, liberdades individuais, coletivo, sociedade. Me indignei profundamente, criei brigas homéricas em almoços e jantares de família ao ouvir comentários tão reacionários e violentos saindo de bocas tão cultas.
E meus próprios desejos começaram a me incomodar. Pensava que, para ser coerente com minhas idéias libertárias, teria que viver uma relação conjugal libertária, que desejar a monogamia era uma caretice. Me desrespeitei, me violentei, experimentei e sofri muito. Fiz análise, um investimento maravilhoso em mim mesma, e a partir daí consegui admitir que desejava sim, essa vidinha pacata, marido, filhos e casa própria, e descobri na militância na área da saúde mental uma forma de canalizar e minimamente divulgar tudo aquilo que aprendi e discuti na faculdade.
Agora, no mestrado em saúde coletiva, com um discreto amadurecimento teórico e na vida, com o apoio de uma amiga e muitas desconhecidas que colocam na internet suas reflexões e militâncias (veja ao lado -> ) a ficha caiu. Que preconceito bobo é esse, ao não me dizer feminista, pensei? Por que militar por uma causa é fazer pensar, é divulgar, é produzir a reflexão. Lutar por um direito é assegurar que quem desejar ou precisar exercê-lo possa não ser perseguido por uma comunidade ou pelo próprio Estado, mesmo que você nunca tenha que passar por isso. É ser a favor do aborto para além da própria religião, dos direitos sexuais mesmo que sua orientação seja a dominante. É ser a favor de cotas tendo entrado na universidade pública sem elas. Ser a favor do SUS tendo plano de saúde. É medir as próprias palavras porque as palavras criam o mundo e o mundo já está preconceituoso pra caramba.
Aí percebi que venho exercendo uma postura feminista, lutando contra o conservadorismo e o masculinismo em minhas práticas mais simples, mais bobas. Sendo chata e cuidadosa em minhas opiniões e ações. Em minha vida monogâmica, classe média, caixa econômica federal (como jocosamente intitulo meu modo de vida), não acho que meu companheiro "me ajude" com a casa, pois ele limpa a casa que é também dele, como eu limpo a que é minha também e cada um faz como pode para que o lugar que moramos juntos esteja do jeito que gostamos. Por que ele passa as roupas dele e eu uso as minhas sem passar. Por que dividimos as contas conforme nossos salários, já tendo eu pagado tudo em alguns meses e ele em outros, por que ninguém tem a pretensão de mandar ou influenciar o outro, por que discutimos todas as decisões, até ambos ficarem bem com elas. Cito exemplos bem bobos, mas que em conversas com muitas mulheres vejo que são questões nevrálgicas nos relacionamentos, onde aparecem a dominação e a submissão sem que ninguém pense nisso.
Mas restava um último viés da questão, que há 1 ano passou a me incomodar de leve, me fez refletir bastante e consegui neste mês trabalhá-lo e resolvê-lo. Fica pra um próximo texto: a questão do anticoncepcional.

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